Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): uma agenda global para nossa casa comum, a Terra

A educação é um processo social, é desenvolvimento. Não é a preparação para a vida, é a própria vida. (Post para Instagram (quadrado)) (Capa para Facebook) (1920 × 600 px) (1)

Ana Paula Piti

Para muitas escolas, os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), definidos na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (sistema intergovernamental do qual faz parte a UNESCO, a agência responsável pela Educação, Ciência e Cultura) já são parte do vocabulário de gestores, professores e alunos. São temas que vêm sendo amplamente discutidos, seja em projetos específicos ou mesmo na rotina da sala de aula.

Por jogarem luz em temas urgentes e universais, como erradicação da fome, combate à desigualdade e à injustiça e contenção das mudanças climáticas, os ODS promovem diretamente o exercício da cidadania, da inclusão e para aquilo que chamamos de Educação para o Desenvolvimento Sustentável. 

Por isso mesmo, o trabalho pedagógico sobre os ODS possibilitam à comunidade escolar se comprometer e se engajar em um projeto global e ambicioso para a sustentabilidade e, portanto, um futuro melhor para o planeta.

Os ODS representam, por si mesmos, um esforço conjunto, em dimensão planetária, em torno dos valores da ONU. Pensar os ODS é pensar a dimensão coletiva da formação humana. As metas e objetivos estabelecidos só serão alcançados se implicar a todos: governos, empresas, instituições públicas e privadas, organizações, redes e pessoas.

No entanto, ainda que os ODS sejam excelentes ferramentas de mobilização, ao concentrar em uma agenda comum temas de alta complexidade, é preciso que nunca nos esqueçamos de estudá-los – inclusive para melhor defendê-los. Cada um dos 17 Objetivos tem, por trás de si, uma história, conflitos e, claro, utopias. A própria construção da maior agenda global dos tempos contemporâneos merece uma reflexão.

(Brochura YA – Página 4)

Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável foram construídos a partir de bases estabelecidas no ano 2000 pelas Nações Unidas: os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), criados com o intuito de seguir o esforço colaborativo e global para garantir avanços civilizatórios em âmbito planetário e para o maior número de pessoas.

Lançados durante a Declaração do Milênio das Nações Unidas, os oito ODM visavam combater a fome e a pobreza, a partir de políticas de saúde, saneamento, educação, habitação, promoção da igualdade de gênero e meio ambiente, e já apresentavam medidas para o estabelecimento de ações conjuntas e globais para o desenvolvimento sustentável. 

Foi após o prazo para o cumprimento dos ODM se esgotar em 2015, e com uma avaliação positiva de seus resultados que se estabeleceram novas metas, atualizadas e ampliadas, respondendo aos desafios atuais.

No artigo: “Os objetivos de desenvolvimento do milênio e sua transição para os objetivos de desenvolvimento sustentável”, Júlio César Roma, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), relata que embora as metas dos ODM não tenham sido atingidas, os progressos significativos obtidos sugeriam que o caminho estava certo. Ele exemplifica referindo-se especificamente ao ODM de número 2 (“garantir a meninos e meninas a oportunidade de terminar o ensino primário”).

Ainda que a meta não tenha sido cravada, foram feitos progressos significativos na expansão do ensino, desde a adoção dos ODM, em 2000. “A taxa de matrícula líquida no ensino primário nos países em desenvolvimento chegou aos 91% em 2015, um aumento em relação aos 83% em 2000. O número de crianças não escolarizadas com idade para frequentar o ensino primário diminuiu quase à metade, em nível mundial, de 100 milhões em 2000 para cerca de 57 milhões em 2015. A taxa de alfabetização entre jovens de 15 a 24 anos aumentou globalmente, de 83% para 91% entre 1990 e 2015, respectivamente, havendo, também, redução na desigualdade de gênero”, escreveu o pesquisador Roma.

Assim, as metas globais funcionam como um eixo organizador de políticas de desenvolvimento humano. Permitem a comparação entre os países e a ação das agências internacionais para apoiar propostas e oferecem base técnica para decisões políticas que competem a cada Estado-membro.

Ao longo dos primeiros anos do milênio, durante a vigência dos ODM, ganhou força o conceito sistêmico de Desenvolvimento Sustentável, que integra a dimensão ambiental, mas dentro de uma perspectiva mais ampla de uma casa planetária – a Terra. Nessa visão, alimentação, educação, saúde, oceanos, florestas, água tornam-se parte de um projeto comum a ser defendido em nome das próximas gerações.

Assim, os ODS sucederam os ODM. Em 2015, para os 17 objetivos e as 169 metas fixados por representantes de 193 Estados Membros da ONU, os países participantes comprometeram-se a adotar medidas transformadoras para promover o desenvolvimento sustentável nos quinze anos seguintes, visando a erradicação da pobreza em todas as suas formas e dimensões, promovendo vida digna a todos. Cada país assumiu o compromisso de trabalhar de acordo com suas prioridades, porém sempre atuando com o espírito de uma parceria global.

OS ODS na Escola

A agenda dos ODS é multidimensional: é tarefa para governos, mas também para a sociedade civil. Compete aos gestores públicos, mas também às empresas, às organizações sociais, aos indivíduos.

É econômica, política, social, cultural, mas também se relaciona diretamente aos desafios educacionais. Entre os ODS, aliás, há um objetivo especificamente voltado para a Educação: trata-se do ODS 4, com 10 metas.

O objetivo global é “assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos”. Cada uma das metas destrincha esse desafio em diferentes dimensões, como a educação para o desenvolvimento sustentável e para a cidadania global, ambientes de aprendizagem efetivos e igualdade de gênero e inclusão.

A meta 4.6, por exemplo, determina que, até 2030, os países devem garantir que todos os alunos adquiram as habilidades necessárias para promover o desenvolvimento sustentável, inclusive por meio da educação para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida sustentáveis, direitos humanos, igualdade de gênero, promoção de uma cultura de paz e não violência, cidadania global e valorização da diversidade cultural e da contribuição da cultura para o desenvolvimento sustentável.

Por tudo isso, as escolas rapidamente entenderam que os ODS poderiam constituir também um eixo de ação pedagógica – o que, no caso brasileiro, foi reforçado pela chegada da Base Nacional Comum Curricular, em muitos aspectos alinhados a essa agenda global.

Embora absolutamente todas as instituições de ensino possam (e devam) trabalhar sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, há um grupo de escolas que têm o compromisso explícito de contribuir ativamente para que os ODS sejam cumpridos, trabalhando como embaixadoras dos princípios da UNESCO. Essas instituições fazem parte do Programa das Escolas Associadas, braço da UNESCO em escolas de educação básica em todo o planeta.

Criada em 1953, e denominada no Brasil como Rede PEA, une 11 mil escolas de 180 países em torno de princípios difundidos pela UNESCO, entre eles o de construir a cultura da paz, promover a educação para o desenvolvimento sustentável e formar gerações conscientes de seu papel como protagonistas de uma cidadania global.

Fazer parte do Programa de Escolas Associadas (PEA) pressupõe um trabalho em consonância com as metas e objetivos fixados, em parceria com as escolas ao redor do mundo, que pertencem também ao Programa UNESCO Associated Schools Network (ASPnet).

Mas, como acima explicado, não é preciso pertencer aos quadros desta rede para agir no sentido proposto pelos ODS. Há incontáveis exemplos Brasil afora, seja na esfera pública e privada. Para esta discussão, selecionamos o exemplo emblemático da Escola Municipal de Ensino Fundamental Sebastião Francisco, O Negro.

Melhor do que discorrer sobre esse projeto é ouvir da voz de duas educadoras protagonistas a narrativa de uma jornada inspiradora da construção de um coletivo feminista.

Débora Casmamie e Janaína Coelho trabalhavam juntas desde 2015, quando Débora, professora polivalente do 5o ano, convidava Janaína a participar das aulas de Ciências para, juntas, discutirem com a turma o tema igualdade de gênero.

Débora está na EMEF Sebastião Francisco, O Negro há 9 anos. Sua preocupação com o tema ficou mais forte quando, em 2015, suas alunas de 5o ano começaram a trazer às professoras relatos de assédio ocorrido dentro e fora da escola. Foi quando, por meio de um dos professores de outra escola municipal, souberam que lá havia um coletivo feminino – e esse foi o impulso de que precisavam para agir.

A partir da conversa com as alunas, em rodas de conversa, foi possível ouvir suas demandas, estabelecendo um ambiente de escuta. Questões do dia a dia, às quais muitas vezes os adultos não dão importância, se mostraram revoltantes e dolorosas – por exemplo, o tempo de quadra sempre menor para as garotas.

Ao mesmo tempo, as professoras ofereciam textos para que lessem e estudassem, vídeos e outros recursos para que a discussão pudesse amadurecer e avançar.

Mas foi apenas dois anos depois, em 2017, após muitos aprendizados, que nascia o coletivo feminista, reunindo um grupo de alunas que voluntariamente se reunia quinzenalmente com as professoras Débora e Janaina, fora do período de aula. Já nessa época, o grupo ganha mais duas professoras: Carol e Malu.

O trabalho estava no começo e não tinha horários e datas muito definidos. Por liberalidade da coordenadora, como o trabalho não era oficial, as professoras eram autorizadas, quando possível, a deixarem outras tarefas para se dedicarem ao projeto informal.

Contudo, sempre disputando espaço com atividades acadêmicas, como as provas bimestrais, os encontros se tornaram mais esporádicos, e foi necessário dar um passo além.

Como na estrutura funcional da Secretaria da Educação paulistana os professores podem dedicar uma hora adicional para atividades no contraturno, no final de 2017, Débora inscreveu a proposta para ser inserida no próprio no Projeto Político Pedagógica da EMEF, para que tivesse chance de ser aprovado e assim passasse a acontecer regularmente.

Dito e feito: em 2018, as reuniões do coletivo começaram a acontecer uma vez por semana, às sextas-feiras, de 12h às 13h30.

Em 2019, um novo avanço: os encontros passaram a acontecer duas vezes por semana, pois um dia só já não bastava – e assim foi até a chegada da pandemia, que dificultou a realização de projetos nesse formato. Mas, em 2022, todos mal podem esperar para novamente retomar o projeto, no ponto em que foi interrompido.

As discussões são fundamentadas em documentos e conceitos que dão estrutura e universalidade às demandas. Por exemplo, a matriz curricular da cidade de São Paulo, o primeiro a ser organizado em torno das ODS.

Assim, também, os ODS 5 são lembrados mas não apenas: entram na roda pautas ligadas à redução das desigualdades, do consumo responsável. Conversam sobre tudo, inclusive sobre a indústria da beleza, os padrões estéticos impostos, o consumismo desenfreado, o incentivo ao consumo de produtos locais, a paz e a justiça.

Na transversalidade da matriz curricular paulistana, a discussão se cruza com determinados objetivos de aprendizagem e habilidades descritas no documento. O tema é feminismo, mas trabalha-se sobre produção de texto, artigo de opinião, leitura, principalmente a produção oral. As professoras trazem vídeos, há debate sobre curtas metragens, produção de resumos. A própria confecção de Lambes é um exercício de produção de textos: elas têm de escrever uma ideia em uma frase, em um exercício de extraordinário potencial pedagógico.

A escola tornou-se um espaço de proposição, de fala e escuta. Envolveu ações artísticas, como a montagem de uma instalação em uma Mostra Cultural. A pedagogia dos projetos encontra ali um palco exemplar: os temas surgem dos encontros e das demandas trazidas pelas meninas.

São questões difíceis, como o drama terrível do estupro, muito discutida no coletivo. O coletivo percebe como a violência contra a mulher é “justificada” até mesmo pela roupa que ela está usando, como se a sociedade dissesse: “se está usando shortinho é porque está pedindo”. Mas do drama brota a arte eloquente e empoderada, como um varal da conscientização com roupas de todos os tipos e tamanhos com frases e símbolos pintados representando ideias do coletivo.

É assim mesmo: a Educação empodera. “A lição mais importante que o coletivo traz é que feminismo é o direito de escolha”, resume Janaína. É um novo mundo que se abre para seres humanos que pedem respeito. “A aluna olha para dentro de si e reflete sobre o que está vivendo e o que quer para a própria vida”, diz Débora.

Para que mais existiria a escola e a educação? “Nós não podemos ser um corpo estranho aqui dentro desse bairro. Nós temos de ser uma parte importante dele. Todo mundo que vive aqui precisa saber que aqui na Zona Leste, em Cidade Líder, tem uma escola que faz a diferença”, finaliza Janaína. É preciso dizer mais?

Projetos bem sucedidos

Escola: EMEF Sebastião Francisco, o Negro – DRE Itaquera

Projeto: Coletivo Feminista Estudantil: diálogos para igualdade de gênero na escola

Escola Premiação da 3a edição do Prêmio Territórios, uma parceria do Instituto com a Secretaria Municipal de Educação.

SDW: Sustainable Development and Water for All

Projeto: Aqualuz

Idealizado por Anna Luísa Beserra, Cientista, empreendedora social brasileira e biotecnologista (UFBA), que atua para democratizar o acesso à água e saneamento no mundo através de tecnologias inovadoras e acessíveis. Desenvolveu mais de 5 tecnologias para o saneamento, beneficiando mais de 14 mil pessoas, e é reconhecida internacionalmente por isso por instituições como a ONU, UNESCO e o MIT. 

Inscrições abertas para a edição 2023 do Projeto Changemaker
https://youraccess.online/changemaker/

Referência Bibliográfica

Os objetivos de desenvolvimento do milênio e sua transição para os objetivos de desenvolvimento sustentável, por Júlio César Roma.

Páginas 14, 15, 16, 17, 18, 19 e 20 Ebook YA Future

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